Tributação de rendimentos obtidos nos EUA por uma pessoa singular residente em território nacional

Introdução

Foi solicitada a análise do enquadramento fiscal, em sede de IRS, dos rendimentos obtidos nos Estados Unidos da América por uma pessoa singular residente em território nacional, bem como das respetivas obrigações declarativas em Portugal.

Em causa está um contribuinte reformado, com nacionalidade americana e brasileira, que em 2025 é considerado residente fiscal em Portugal e aufere rendimentos de fonte norte-americana de diversa natureza.

Para o correto enquadramento da situação, importa articular as normas do Código do IRS com a Convenção para Evitar a Dupla Tributação celebrada entre Portugal e os EUA, incluindo o respetivo Protocolo, cuja aplicação suscita particular complexidade quando esteja em causa a nacionalidade americana.

Enquadramento fiscal dos rendimentos

Nos termos do artigo 15.º, n.º 1 do Código do IRS, as pessoas singulares residentes em território português estão sujeitas a tributação em Portugal pela totalidade dos rendimentos obtidos, incluindo os de fonte estrangeira.

Todavia, sempre que existam rendimentos obtidos no estrangeiro, deve atender-se às regras previstas na Convenção para Evitar a Dupla Tributação aplicável, neste caso a CDT celebrada entre Portugal e os Estados Unidos da América, a qual define a repartição do poder de tributação entre o Estado da residência e o Estado da fonte.

Pensões de fundos de pensões privados

De acordo com o artigo 20.º da CDT Portugal–EUA, as pensões pagas por fundos de pensões privados, quando resultem de um emprego anteriormente exercido, são tributáveis exclusivamente no Estado da residência do beneficiário. O mesmo regime se aplica quando as importâncias recebidas resultem de contribuições efetuadas pelo próprio beneficiário.

Assim, em regra, estando o beneficiário residente em Portugal, estas pensões seriam apenas tributadas em Portugal, em sede de IRS.

Pensões da segurança social dos EUA

As pensões e outros benefícios pagos pela segurança social norte-americana estão sujeitos a um regime de tributação cumulativa. Isto significa que podem ser tributados tanto nos EUA como em Portugal, de acordo com a legislação interna de cada Estado.

Nestas situações, compete ao Estado da residência, ou seja, Portugal, eliminar a dupla tributação internacional através da concessão de um crédito de imposto, nos termos do artigo 81.º do Código do IRS. Este crédito corresponde ao menor entre o imposto efetivamente pago nos EUA e a fração do IRS português correspondente aos rendimentos de fonte americana.

Juros e dividendos

Os juros de aplicações financeiras e os dividendos de ações de fonte norte-americana auferidos por um residente em Portugal também se enquadram num regime de tributação cumulativa, conforme previsto nos artigos 11.º (juros) e 10.º (dividendos) da CDT. Contudo, trata-se de uma tributação cumulativa limitada, uma vez que a Convenção estabelece limites máximos às taxas que podem ser aplicadas pelo Estado da fonte. No caso dos dividendos, a taxa não pode exceder 15 por cento, e no caso dos juros, 10 por cento.

Tal como nas pensões da segurança social, a eliminação da dupla tributação compete a Portugal, mediante a atribuição do crédito de imposto previsto no artigo 81.º do Código do IRS.

Para que os EUA apliquem estas taxas reduzidas previstas na Convenção, o beneficiário dos rendimentos deve comprovar previamente a sua qualidade de residente fiscal em Portugal, mediante a apresentação de certidão de residência fiscal emitida pela Autoridade Tributária portuguesa, disponível no Portal das Finanças.

Impacto do Protocolo da Convenção

Não obstante o enquadramento acima descrito, importa considerar o disposto no Protocolo anexo à CDT, que faz parte integrante da mesma. Nos termos da alínea b) do n.º 1 desse Protocolo, os Estados Unidos reservam-se o direito de tributar os seus cidadãos como se a Convenção não existisse.

Isto significa que, quando o beneficiário dos rendimentos seja cidadão norte-americano, os EUA podem tributar todos os rendimentos com base no critério da nacionalidade, independentemente das regras de repartição de competência previstas na Convenção.

Na prática, tal implica que rendimentos que, em condições normais, seriam de tributação exclusiva em Portugal, como as pensões de fundos de pensões privados, podem ser igualmente tributados nos EUA. Do mesmo modo, juros e dividendos podem ser sujeitos às taxas internas norte-americanas, sem aplicação dos limites previstos na CDT.

Nestas situações, a eliminação da dupla tributação internacional deixa de competir a Portugal e passa a ser assegurada pelos EUA, através da dedução do imposto pago em Portugal, nos termos do artigo 25.º da Convenção.

Obrigações declarativas em Portugal

Independentemente do regime de tributação aplicável, todos os rendimentos obtidos nos EUA por uma pessoa singular residente em Portugal devem ser declarados na declaração modelo 3 de IRS, através do anexo J.

As pensões devem ser declaradas no quadro 5 do referido anexo, enquanto os juros e dividendos devem ser declarados no quadro 8, utilizando os códigos E21 e E11, respetivamente.

Nestes quadros deve ser indicado apenas o imposto pago nos EUA que resulte da aplicação das normas da Convenção. O imposto suportado exclusivamente com base no critério da nacionalidade, previsto no Protocolo, não deve ser considerado para efeitos de crédito de imposto em Portugal.

Conclusão

Em síntese, os rendimentos de fonte norte-americana auferidos por uma pessoa singular residente em Portugal estão, em regra, sujeitos a tributação em IRS, nos termos do Código do IRS e da CDT Portugal–EUA. Contudo, quando o beneficiário seja cidadão dos Estados Unidos, o Protocolo da Convenção introduz uma exceção relevante, permitindo aos EUA tributar os rendimentos com base na nacionalidade, o que altera substancialmente o mecanismo de eliminação da dupla tributação.

Face à complexidade do enquadramento e às implicações práticas ao nível da tributação e da declaração dos rendimentos, recomenda-se uma análise caso a caso, devidamente sustentada na natureza concreta dos rendimentos, na forma como foram tributados nos EUA e na correta aplicação das normas convencionais e internas.

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